sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A Filosofia do EU

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“Nenhuma época acumulou sobre o homem tão numerosos e diversos conhecimentos como a nossa [...] Nenhuma época conseguiu tornar esse saber tão pronta e facilmente acessível. Mas nenhuma época tampouco soube menos o que é o homem” (HEIDEGGER, 1997)



A marca da contemporaneidade inegavelmente é o desenvolvimento da ciência e de toda a tecnologia que advém desta, porquanto as mudanças ocorridas no “modus vivendi” do homem nos encanta e mantêm-nos motivados a continuar na busca pelo aprimoramento desse estilo de vida cada vez mais “high tech”.

Pensando assim poderíamos nos perguntar se nesse mundo cabe algum tipo de filosofia, posto que o espaço midiático e as atenções são consumidas pela ciência e pela tecnologia. Porém seria desastroso formular tal questão tendo em vista a filosofia emergir não de uma condição momentânea ou de determinado arranjo societário, mas da própria condição existencial do homem que diante daquilo que dele surgiu incomoda-se, constrange-se. Então o traço distintivo do mundo contemporâneo, a saber, a ciência e a tecnologia não impedem o fluir da filosofia, ao contrário faz entrever uma nova forma de entender, interpretar, decidir, enfim viver nesse atual momento histórico.

Como toda filosofia que vai a busca do alicerce, da matriz originária do pensamento do qual emerge, quer sejam estruturas sólidas ou castelos de areia, o pensamento que sustenta a ação hodierna do homem no mundo fundamentado na ciência e na tecnologia é um tipo de filosofia que de novo nada possui, pois foi inaugurada com Platão e ao longo da história do homem ganhou novas facetas com diversos pensadores, mas, retiradas suas vestes se apresenta, tanto hoje como dantes, como uma metafísica, a metafísica da subjetividade. Tal cenário possibilitaria àqueles que resistem ao refletir filosófico a condição de dizer que esse mundo seria então o mundo da não filosofia, porém estes perderam a capacidade de ver, pois como disse Merleau-Ponty, “a verdadeira filosofia é reaprender a ver o mundo”.

Encontrado o fundamento tanto do pensamento quanto do que sustenta a ação do homem contemporâneo, quais as consequências que brotam do binômio pensar-fazer? A princípio encontramos na metafísica da subjetividade como em qualquer outro pensamento metafísico a definição de um ponto de apoio, qual seja, a própria subjetividade, que em outros termos nos remete ao sujeito. Então o sustentáculo da metafísica contemporânea é o sujeito, para o qual tudo quanto existe, existe para o sujeito, tudo quanto é, de qualquer maneira que seja, só é para o sujeito.

Ora, essa compreensão nos obriga firmemente a retomar a ideia que emana de toda a teoria do conhecimento, onde a presença do sujeito requer de modo imperativo a presença do objeto. Pensar aquele que conhece, exige aquilo que será conhecido, resultando enfim numa relação de conhecimento. Entrementes não é apenas isso, pois o sujeito não meramente conhece o objeto, no sentido teórico, mas, sobretudo de modo prático ele inventa, engendra, maneja, por fim manipula o objeto. Isto posto, avistamos um outro dilema, a saber, o homem, sujeito do conhecimento, que manipula o objeto do conhecimento, e como tudo que é conhecido ou se coloca como a ser conhecido por este sujeito transforma-se em objeto, por conseguinte manipulável, o próprio homem põe-se como um desses elementos a serem manipulados por ele mesmo.

Aqui encontramos um dos problemas da contemporaneidade, onde a manipulação imposta pelo homem a tudo quanto existe, inclusive a ele mesmo, torna o real em coisa, banalizando o existente, futilizando o objeto, criando a cultura da descartabilidade, verificada no consumo do desnecessário. Tal lógica transfere-se como consequência inevitável para o homem e suas relações. Destarte, após coisificarmos o mundo e por efeito o homem, o manipulamos segundo a nossa vontade. Usamos e descartamos quando não mais precisamos. É o que fazemos com nossos idosos que já não servem mais, é o que fazemos com o nosso funcionário que não é mais útil, é como dispomos dos nossos “amores de um dia” quando termina o carnaval ou qualquer outra festa que seja. O fato é que tanto os objetos quanto as pessoas são coisas descartáveis, já que a base do nosso pensamento sustenta que tudo é para o homem, podendo este desfrutar como, quando e onde quiser.

Outro problema que se anuncia é que se tudo é manipulável pelo homem como consequência do domínio da técnica e da ciência, ações que promovem todo tipo de destruição, sejam em massa ou não, podem ser justificadas como fruto da manipulação, ou uma extensão desta, permitida pelo controle do sujeito sobre o objeto.

Chegamos neste momento ao cinema de horror que vemos diariamente apresentado em nossas casas através de toda mídia, as demonstrações de barbárie que ultrapassam qualquer cenário de guerra declarada. A reflexão filosófica a qual somos convidados a fazer é que no fundamento da barbárie a que somos submetidos a conviver está a metafísica da subjetividade, está o sujeito manipulador, está o homem com toda a sua pseudo-onipotência, emanada da nossa capacidade de controle oriunda da tecnologia, da técnica, da ciência.

Parafraseando Heidegger, em nenhuma época o homem alcançou tamanho desenvolvimento, conseguiu caminhar a passos tão largos em busca do conhecimento, e o que auferiu nessa jornada foi o distanciamento de si mesmo. A Filosofia do Eu nada mais fez do que levar o homem para bem longe do SER do Homem.

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